Menu

ilustração.2.Artigo.Lucas.GomesFuncionamento do CALANGO - O programa recebe dados de entrada de três conjuntos de informações: fenotípicos, evolutivos e genéticos. De posse dessas informações, o programa constrói sofisticados modelos estatísticos integrando as diferentes informações para buscar por alterações genéticas associadas ao fenótipo de interesse.CALANGO permite detectar o papel de um segmento da estrutura do DNA, o que pode viabilizar o impedimento de doenças ou provocar outras mudanças em seres vivos

Os seres vivos apresentam uma grande diversidade. Seja em níveis molecular, morfológico, comportamental e ecológico, existem dezenas de diferentes tipos de células que compõem os corpos de animais e plantas, desde espécies unicelulares microscópicas até linhagens multicelulares macroscópicas. Também podem ser muito diferentes características como massa, altura e modo de locomoção, por exemplo.

Para auxiliar cientistas a detectarem fatores genéticos associados às diferentes características observadas em espécies distintas, um software gratuito acaba de ser lançado pelo grupo de pesquisa do Laboratório de Algoritmos em Biologia (LAB) do Departamento de Genética, Ecologia e Evolução do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG. Liderados pelo professor Francisco Pereira Lobo, eles levaram em consideração o fato de que uma fração da informação necessária para produzir toda essa variedade de características de cada espécie está codificada nos genes encontrados nos genomas, e, partiram de um estudo detalhado, utilizando ferramentas de bioinformática.

As características observáveis de um organismo são os fenótipos. Segundo Lobo, “a genética contemporânea tem como um de seus desafios descrever as associações entre a variação dos genes dos organismos, o genótipo, com os seus diferentes fenótipos”. Ele explica também que as características fenotípicas são parcialmente herdáveis. Ou seja, passam dos pais para seus descendentes, por meio dos genes. E veio daí o “pulo do gato”.

VARIAÇÕES ENTRE ESPÉCIES

“Nossa ferramenta permite gerar hipóteses testáveis sobre associações genótipo-fenótipo em múltiplas espécies, que possibilitam priorizar alvos para posterior caracterização experimental, com uma grande aplicação em diferentes campos da biologia”, afirma o professor do ICB UFMG, mestre em Bioquímica e Imunologia e doutor em Bioinformática, Ele chama a atenção para o fato de que a maioria das variações genéticas e fenotípicas ocorrem entre espécies diferentes, e não em uma única.

“Identificar essas associações pode nos permitir detectar quais genes possuem algum papel na emergência dos diferentes fenótipos entre as espécies e talvez nos permitir agir para impedir ou promover essas mudanças”, esclarece. Embora os modelos estatísticos usados na ferramenta não sejam novos, esta é a primeira vez que eles foram usados de forma integrada para extrair novas perspectivas biológicas de dados genômicos.

Para Felipe Campelo, da Aston University, do Reino Unido, e um dos colaboradores internacionais do projeto, "há muitos exemplos de como essa ferramenta pode ser aplicada para resolver problemas relevantes que enfrentamos hoje. Estes incluem a exploração da coevolução de bactérias e bacteriófagos e a detecção de fatores genéticos associados ao tamanho das plantas, com implicações diretas para a agricultura e ecologia".

A metodologia desenvolvida tem o potencial de ser aplicada em diferentes áreas de pesquisa, permitindo que cientistas analisem as quantidades massivas de dados genéticos disponíveis para identificar os mecanismos genéticos associados à evolução de fenótipos complexos em diferentes espécies. “Outras aplicações potenciais incluem o suporte à investigação da resistência bacteriana aos antibióticos e do rendimento de espécies vegetais e animais de importância econômica”, afirma Lobo.

calangoCALANGO - Comparative AnaLysis with ANnotation-based Genomic cOmponentes (assim mesmo, com “L”, “N” e “O” maiúsculos, e que em tradução livre seria algo como “Análise comparativa baseada em anotação de componentes genômicos), é uma ferramenta computacional de genômica comparativa que utiliza três conjuntos de informações: fenotípicas, evolutivas e genéticas. CALANGO constrói sofisticados modelos estatísticos integrando as diferentes informações para detectar variações genéticas associadas ao fenótipo de interesse, estabelecendo assim as associações genótipo-fenótipo em larga escala, com o potencial de auxiliar cientistas a investigarem uma ampla gama de questões, como a evolução da resistência antibacteriana e o melhoramento genético de culturas agrícolas.

A ferramenta está disponível no site do projeto e também na rede de servidores web que armazena versões de código e documentação de software livre, o CRAN (https://cran.r-project.org/package=CALANGO).

PESQUISA INTERNACIONAL

No caso das plantas terrestres, por exemplo, é notória a existência de pequenas espécies, comuns no nosso dia a dia, como as plantas ornamentais ou usadas na alimentação, atéalguns dos organismos mais altos e longevos da Terra, incluindo árvores com milhares de anos e dezenas de metros de altura. Essas, e outras características observáveis, são denominadas fenótipos. Em pessoas, fenótipos que comumente apresentam variação entre indívidus incluem o tipo de cabelo, a cor da pele e dos olhos.

ilustraçãoPor que os bichos voam? Os animais evoluíram, e com eles o seu voo – A- Morcegos, aves e insetos são grupos de organismos onde o voo evoluiu independentemente (em azul). O ancestral comum destes organismos não era um organismo voador (seta vermelha e seta verde indicam exemplos de ancestrais comuns não-voadores). B- Na imagem, vemos membros superiores de humanos, gatos, baleias e morcegos. Esses membros possuem estruturas que estavam presentes no último ancestral comum destes organismos (estruturas homólogas representadas com a mesma cor nas diferentes espécies). C- Da esquerda para a direita, vemos asas de insetos, pterossauros, aves e morcegos. Estruturas homólogas estão ressaltadas com as mesmas cores em pterossauros, aves e mamíferos, enquanto estruturas análogas estão ilustradas em roxo. Embora superficialmente similares, as estruturas internas das diferentes asas são fundamentalmente diferentes, e são uma convergência evolutiva na evolução independente do voo nestes organismos.Para explicar como CALANGO funciona, Lobo usa como exemplos os animais que voam. “Corvos, pombos, pterodáctilos, mariposas e morcegos apresentam o voo como modo de locomoção, embora os dois primeiros sejam aves e os três últimos não sejam”, esclarece. Os últimos são pterossauros, insetos e mamíferos, respectivamente. Lobo explica que a evolução do voo em aves, pterossauros, insetos e mamíferos ocorreu de maneira independente (veja a ilustração ao lado). Assim, a biologia do voo em corvos e pombos, ambas espécies de aves, provavelmente compartilha aspectos genéticos devido à sua ancestralidade comum. Ambas as espécies são capazes de voar atualmente porque seu último ancestral comum - uma ave ancestral - também era um organismo voador. As estruturas anatômicas que permitem o voo em ambas as espécies são, em grande parte, homólogas. Em contraste, morcegos e mariposas têm a capacidade de voar por meio de alterações genéticas potencialmente diferentes e independentes das alterações genéticas observadas nas aves, uma vez que o último ancestral comum de aves, mamíferos e insetos não era um animal voador. Como o ancestral comum de todos estes organismos não era um organismo voador (seta vermelha na ilustração), o voo evoluiu independentemente nestes grupos. “Todas as evidências sugerem que era um organismo aquático”, afirma. “Similaridades fenotípicas, as características observáveis entre espécies, podem surgir tanto via ancestralidade compartilhada, homólogos, como também através de pressões evolutivas compartilhadas, ou evolução convergente”. Estruturas análogas são superficialmente semelhantes. Têm a mesma função, mas são observadas independentemente em espécies diferentes, estando ausente no ancestral comum das mesmas.

LEIA O ARTIGO

CALANGO: a phylogeny-aware comparative genomics tool for discovering quantitative genotype-phenotype associations across species
Jorge Augusto Hongo (Unicamp), Giovanni Marques de Castro (ICB UFMG), Alison Pelri Albuquerque Menezes (ICB UFMG), Agnello César Rios Picorelli (ICB UFMG), Thieres Tayroni Martins da Silva (ICB UFMG), Eddie Luidy Imada (Weil Cornell), Luigi Marchionni (Weil Cornell), Luiz-Eduardo Del-Bem (ICB UFMG), Anderson Vieira Chaves (ICB UFMG), Gabriel Magno de Freitas Almeida (UiT), Felipe Campelo (Aston), Francisco Pereira Lobo (ICB UFMG).
Revista Patterns. CellPress. June 9, 2023
https://doi.org/10.1016/j.patter.2023.100728

 

Fontes das ilustrações: https://www.bio.miami.edu/dana/106/106F05_4.html e https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fphys.2020.01038/full, modificadas pelo autor.

 

Redação: Marcus Vinicius dos Santos MTB 6139 MG

Pesquisar

Instagram Facebook Twitter YouTube Flickr
Topo