Revista de Psicofisiologia, 2(1), 1998

Reações autonômicas e hormonais

6.12) Câncer

Sabemos, hoje em dia, que o câncer pode ser causado por substâncias cancerígenas, por predisposição genética, por irradiação e talvez até pela dieta. Porém, nenhum desses elementos, por si só, podem explicar porque algumas pessoas desenvolvem câncer e outras não. Por isto, acredita-se que o câncer possui causas externas também.

Muitos estudos tem sido feitos no sentido se obter maior conhecimento sobre o câncer. Um deles foi feito com camundongos criados especialmente para a pesquisa devido à grande suscetibilidade dos mesmos à doença e levantou dúvidas em relação a teoria da predisposição genética, unicamente. Os camundongos foram divididos em dois grupos, sendo que um deles foi submetido a altos níveis de estresse e o outro, o grupo controle, foi mantido em um ambiente livre. Os resultados apresentaram-se muito interessantes e mostraram que 92% dos camundongos que foram submetidos a situações estressantes desenvolveram câncer, o que aconteceu com apenas 7% dos camundongos do grupo controle. Isso significa que a quantidade de estresse no ambiente tem um impacto significativo sobre o desenvolvimento da doença, apesar da predisposição genética dos camundongos ao câncer.

Consideremos que as mudanças ligadas ao estresse ocorrem juntamente com o advento da industrialização, ou seja, juntamente com os benefícios da tecnologia, fatores geradores de doenças, devem fazer parte de nossa reflexão.

Alguns pesquisadores sugerem que o desenvolvimento de certos tipos de câncer podem ter relação com a quantidade de gordura na alimentação. Pesquisas feitas no Japão, por exemplo, onde a dieta é feita à base de arroz e peixe, com baixos níveis de gordura, mostram uma menor incidência da doença entre as pessoas do que no caso dos europeus ou americanos, onde a dieta é rica em gorduras. Diferenças na alimentação foram utilizadas por esses pesquisadores como uma possível explicação para desenvolvimento do câncer. Porém, além da dieta, existem outros fatores que podem explicar a baixa incidência de câncer no Japão, como os fatores culturais, por exemplo, a cultura exerce grande influência no modo de vida, nas convicções e sentimentos das pessoas.

Outros estudos mostraram estranhas descobertas comparando-se a incidência de câncer entre os esquizofrênicos internados catatônicos e paranóicos. Os indivíduos catatônicos fecham-se à qualquer tipo de contato com o mundo exterior isolando-se e protegendo-se dele e sua suscetibilidade em relação ao câncer é muito pequena. Já os esquizofrênicos paranóicos são extremamente sensíveis à qualquer tipo de contato com as pessoas que os cercam e a incidência de câncer entre eles é bem maior do que na população em geral. É interessante lembrar que a alimentação dos catatônicos e paranóicos é geralmente do mesmo tipo, pois em muitos casos eles moram ou ficam o dia todo em instituições.

No entanto, nenhum destes resultados, por si só, podem oferecer explicação satisfatória sobre as causas do câncer. Qualquer explicação que seja deverá levar em conta uma das causas do câncer, a queda das defesas naturais do indivíduo contra as doenças.

É interessante relatar a experiência do casal Simonton nos EUA, onde os pacientes foram submetidos a um tratamento psicossomático, que produziu uma remissão 30% maior do que nos outros hospitais só com tratamento alopático idêntico (Simonton et al, 1987).

  1. O sistema imunológico é uma defesa natural

Um dos fatores mais importantes na saúde e na doença é a defesa natural do corpo humano. A maioria dos médicos aceita a "teoria de vigilância imunológica" para explicar o desenvolvimento do câncer. Segundo essa teoria, o organismo de todas as pessoas produz células anormais no corpo, de tempos em tempos, seja devido a fatores externos, seja por uma reprodução celular incorreta. Ao sistema imunológico cabe a tarefa de vigiar o aparecimento dessas células e destruí-las.

Nesse sentido, para que haja o desenvolvimento do câncer, o sistema imunológico, de alguma maneira, deve encontrar-se inibido. Alguns fatores devem estar relacionados com essa falha, como fatores emocionais e mentais da saúde e da doença, existindo conexões significativas entre estados emocionais e doenças.

Como sabemos, há uma forte relação entre níveis de estresse e doenças e se pode predizer as doenças baseando-se na quantidade de estresse a que as pessoas estão submetidas no seu dia-a-dia. Selye (1959), a partir da década de 20, foi responsável por vários estudos que demonstraram que as emoções podem causar doenças e estudos mais recentes corroboram suas pesquisas.

Descobertas sugerem que efeitos do estresse emocional podem suprimir o sistema imunológico, o que abaixa as defesas contra o câncer e outras doenças. O estresse pode predispor uma pessoa a doenças, mas o modo como elas lidam com os acontecimentos, mesmo que eles sejam estressores, e a importância que a eles atribuem vão ser diferentes. Por exemplo, a perda de um emprego para uma pessoa de 20 anos será interpretada de maneira diferente de uma pessoa de 50 anos, e com certeza, essa perda será mais estressante para a pessoa de 50 anos.

O estresse pode se acumular a tal ponto que uma pessoa não conseguirá mais lidar com os acontecimentos e então adoecerá. Holmes e Masuda reconheceram a importância da reação de uma pessoa diante do agente estressor ao analisarem as razões do estresse como conseqüência das doenças. Uma de suas explicações foi a de que a atividade de lidar com problemas faz com que a resistência a doenças diminua quando falta às pessoas, por exemplo, pertinência aos problemas a serem resolvidos. Se a energia é gasta na tentativa de lutar contra o ambiente problemático, pouca energia restará para a prevenção contra as doenças.

  1. As descobertas recentes levam a um retorno ao indivíduo

Alguns temas, dentre os mais abordados nas pesquisas atuais são:

  • elevados níveis de estresse emocional aumentam a suscetibilidade às doenças;

  • o estresse crônico atua de modo a suprimir o sistema imunológico, que por sua vez gera maior suscetibilidade às doenças, entre elas, o câncer;

  • o estresse emocional, além de suprimir o sistema imunológico também leva ao desequilíbrio emocional e pode vir a aumentar a produção de células anormais no momento em que o corpo não se encontra apto a destruí-las, podendo chegar a induzir até erro genético.

Assim, mais uma vez, a ênfase é dada à maneira como as pessoas enfrentam os problemas. Pesquisadores podem prever maior suscetibilidade a doenças com base no número de fatores estressantes na vida de uma pessoa.

No entanto, muitas pessoas que vivem sob grandes cargas de estresse não ficam doentes. Torna-se necessário, então, examinar a reação de cada uma delas diante do fator estressante. O próximo passo, e talvez o mais importante, deve ser dado no sentido de desvendar o tipo de reação que torna as pessoas mais suscetíveis ao desenvolvimento do câncer, já que todos nós aprendemos a lidar com fatores estressantes, seja de uma maneira ou de outra.