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Pesquisa coordenada por Eduardo Tarazona, professor do departamento de Genética, Ecologia e Evolulção, investigou carga africana no genoma dos povos americanos; Componente genético é o mais homogêneo no Novo Mundo

30O DNA das populações americanas é testemunha do tráfico de 9 milhões de africanos, que eram forçados a deixar suas nações e atravessar o Atlântico rumo à escravidão durante três séculos, entre XVI e XIX. A evidência é apontada no artigo “Origens, dinâmicas da miscigenação e homogeneização do gene africano nas américas” (em tradução livre), publicado na última semana na periódico científico “Molecular Biology and Evolution”, da Universidade de Oxford.

Envolvendo um time internacional de pesquisadores e liderado pelo grupo brasileiro coordenado pelo professor Eduardo Tarazona-Santos, do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) e membro do Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares (Ieat), ambos da UFMG, o estudo respondeu a três principais proposições e ajuda a compreender o miscigenado genoma americano.

Respostas

“Buscamos compreender, primeiro, a origem africana das diferentes populações da América, em que buscamos focar o componente genético daquele continente e entender de que parte da África viemos”, explica Tarazona-Santos. Reunindo dados do genoma de 6.267 indivíduos de 22 populações africanas e americanas, a pesquisa demonstrou haver uma correlação entre os trajetos feitos pelos navios de transporte de pessoas escravizadas e características mais predominantes nos genes. Assim, o estudo identificou mais traços de povos sul-africanos na região Sul do Brasil, enquanto no Caribe e na América do Norte as características mais comuns são de populações mais próximas ao Trópico de Câncer.

A segunda questão proposta visava investigar se a miscigenação estava associada à dinâmica da chegada de escravizados. “Constatamos que, no período mais crítico, de pico do tráfico de africanos, entre 1750 e 1850, houve uma intensificação da miscigenação em todo o continente americano”, aponta.

Por fim, os estudiosos buscaram compreender se, com a diáspora, os povos africanos trouxeram para o continente toda a sua diversidade genética. “Surpreendentemente, descobrimos que sim. Com o tráfico de pessoas escravizadas, o genoma complexo e diverso africano, de onde a humanidade se originou, chegou às Américas, de forma que o fragmento africano tem tanta diversidade quanto naquelas populações”, examina.

Tarazona-Santos indica, ainda, um novo dado observado pelo estudo, conduzido por 37 pesquisadores de 18 instituições: “Um brasileiro do Sul e um afro-americano são geneticamente mais similares no seu componente africano do que um moçambicano versus um nigeriano”, sustenta. Tal fato se dá porque, “nos últimos 500 anos, nós, americanos, nos misturamos mais do que na África, e a parte africana do nosso genoma virou mais homogênea entre as populações das Américas”, explica. Estes resultados têm relevância médica, pois significam que as variantes genéticas responsáveis por doenças estão mais homogeneamente distribuídas entre as diferentes populações das Américas do que na África.

 

Continuação

O estudo do grupo de pesquisadores da UFMG é, de certa maneira, uma sequência de outra publicação, de 2015, com enfoque no estudo do Brasil. Trata-se de um dos trabalhos científicos liderados por brasileiros mais citados por outros cientistas nos últimos cinco anos.

Financiamento

Os dois estudos tiveram como principal financiador o Ministério de Saúde. “Hoje, há uma restrição de verba para a pesquisa, o que faz com que esses trabalhos sejam cada vez menos possíveis”, lamenta Eduardo Tarazona-Santos.

Um novo olhar para a saúde

Entendido como um importante passo para a compreensão do genoma americano, o artigo recém-publicado e que remete a uma pesquisa liderada por estudiosos brasileiros pode representar uma evolução em termos de saúde pública.

Ocorre que, dos genomas sequenciados hoje, 80% são de origem europeia e outra boa porção é asiática. Assim, “sem a análise do mosaico do DNA dos povos americanos e africanos, especificidades dessa população (estudada) eram comumente negligenciadas – o que poderia resultar até mesmo em tratamentos ineficazes ou tóxicos.

“Diagnósticos médicos, cada vez mais, estão vindo a partir de conhecimentos genéticos. Mas, em boa parte, esse conhecimento está concentrado nas populações europeias”, sinaliza Eduardo Tarazona-Santos. Por isso, prossegue, é fundamental que cada vez mais estudos se debrucem sobre o genoma de povos de outras regiões do mundo. “Com a diáspora africana, a compreensão deste fator genético depõe pela democratização da ciência”, situa.

Um dos apontamentos imediatos que o estudo permitiu diz sobre uma pulverização mais homogênea de doenças genéticas, como o câncer de mama, em países americanos. Uma explicação para esse fato está ligada à conclusão de que a parte africana do nosso genoma virou mais homogênea entre as populações das Américas.

No país, no fim de 2019, um outro esforço foi lançado com objetivo de compreender melhor a composição genética dos brasileiros. Trata-se do DNA do Brasil, que vai estudar a fundo dados de 15 mil pessoas.

Leia o artigo aqui

(Mídia é uma tentativa da ACbio de reunir notícias sobre o ICB)

Foto: Pixabay

 

 

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