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Foto Ricardo Solar (arquivo pessoal)Foto Ricardo Solar (arquivo pessoal)

As florestas tropicais são riquíssimas, tanto em biodiversidade quanto em estoques de carbono. À medida que a humanidade tenta reverter as mudanças climáticas induzidas pelo homem, será que focar a proteção em estoques de carbono também irá garantir a preservação da enorme diversidade encontrada nas florestas?

Um estudo publicado hoje no renomado periódico científico Nature Climate Change sugere que a resposta para esta pergunta está longe de ser um mero sim ou não. O time internacional de pesquisadores, incluindo o professor Ricardo Ribeiro de Castro Solar (foto abiaxo), do departamento de Biologia Geral do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG (ICB), encontraram que os investimentos almejando prevenir grandes emissões de carbono nas florestas tropicais do globo podem não ser totalmente eficazes na proteção da biodiversidade exatamente das florestas ecologicamente mais valiosas, as florestas intocadas.

O quadro alarmante revela que, nestas florestas, até 77% das espécies que deveriam ser protegidas pelas políticas focadas em biodiversidade, não são protegidas por esquemas unicamente direcionados à conservação de estoques de carbono.

“É claro que isto não quer dizer que devemos mudar nosso foco em preservar os valiosos estoques de carbono das florestas tropicais!”, diz o Prof. Ricardo Solar, também do Programa de Pós-Graduação em Ecologia, Conservação e Manejo de Vida Silvestre (ECMVS) do ICB da Universidade Federal de Minas Gerais.

Ele ainda ressalta que “O tamanho das mudanças causadas pela atividade antrópica é enorme e tem muitos efeitos. Então, conciliar conservação da biodiversidade com preservação de estoques de carbono não é um problema que pode ser solucionado por uma única via! Por um lado, é extremamente necessário garantir que as florestas permaneçam como nossos grandes estoques carbono. Isto não somente irá reduzir a velocidade do aquecimento global, mas de fato em várias áreas, esta política irá salvaguardar a biodiversidade inigualável que habita estes ecossistemas. Por outro lado, para garantir plena proteção, a biodiversidade também deve ser tratada em mesmo nível de prioridade – junto com o carbono – nos esforços de conservação”.

Florestas tropicais são fundamentais

As florestas tropicais armazenam mais de um terço de todo o carbono terrestre do mundo. Fenômenos causados por ação humana, como o desmatamento e as perturbações florestais (extração de madeira, caça, incêndios e fragmentação florestal) podem provocar a liberação do carbono e exacerbar os efeitos das mudanças climáticas globais.

Por essa razão, a proteção do carbono das florestas tropicais é uma das principais metas das iniciativas internacionais de combate às alterações climáticas, atraindo dezenas de bilhões de dólares em financiamento todos os anos.

Relação entre carbono e biodiversidade

Para chegar às principais conclusões do estudo, a equipe internacional, composta por cientistas de Brasil, Europa e Austrália, passou 18 meses realizando medições do conteúdo de carbono e da variedade de espécies de plantas, pássaros e besouros em 234 áreas de florestas tropicais na Amazônia brasileira. Em uma primeira etapa, foram avaliados os níveis de carbono e de biodiversidade em áreas ao longo de um gradiente florestal (os variados graus de interferência humana): desde as florestas conservadas até aquelas crescendo após a completa supressão da vegetação pelo desmatamento. De posse dos dados inéditos, a equipe descobriu que mais carbono significava mais biodiversidade em florestas severamente danificadas, como previsto. Contrariando as expectativas, no entanto, onde os impactos humanos eram menos intensos, quantidades crescentes de carbono não eram acompanhadas por mais espécies.

Para Gareth Lennox, pesquisador-sênior da Universidade de Lancaster e co-líder da pesquisa, “a mudança na relação entre carbono e biodiversidade entre as florestas quesofreram diferentes níveis de distúrbios provocados por ação humana explica nossas descobertas. Conforme as localidades desmatadas e altamente perturbadas se recuperam dos efeitos do uso agrícola e de incêndios florestais graves, a biodiversidade também se recupera. No entanto, essa relação direta entre carbono e biodiversidade perde-se na etapa intermediária da recuperação. O resultado: as florestas com o maior teor de carbono não abrigam necessariamente mais espécies, o que significa que a conservação focada exclusivamente no carbono pode deixar de lado áreas bastante biodiversas das florestas tropicais.”

Foto Ricardo Solar (arquivo pessoal)Foto Ricardo Solar (arquivo pessoal)Foco duplo: biodiversidade e carbono

Juntamente com as descobertas mais preocupantes, o estudo oferece esperança para o alinhamento dos esforços de conservação de carbono e biodiversidade. "Embora algum nível de perda seja inevitável, os conflitos de estratégia entre o carbono e a biodiversidade podem ser reduzidos por um planejamento mais integrado", explica Toby Gardner, pesquisador-sênior do Instituto Ambiental de Estocolmo (SEI, na sigla em inglês), na Suécia, um dos coautores do trabalho científico. “Ao considerar carbono e biodiversidade juntos, descobrimos, por exemplo, que o número de espécies de árvores grandes que podem ser protegidas aumenta em até 15% em relação à abordagem com foco exclusivo no carbono. Em contrapartida, nessa mesma situação, há redução de apenas 1% de carbono.”

Embora ferramentas promissoras de sensoriamento remoto estejam sendo desenvolvidas para medir o carbono florestal, promover a proteção da biodiversidade por meio de investimentos focados em carbono só será possível com o monitoramento extensivo em campo. No entanto, no Brasil, o progresso nessa área tem sido extremamente aquém do necessário. Joice Ferreira, da Embrapa e co-líder da pesquisa descreve a situação: “Como país megadiverso, o Brasil precisa de mecanismos adicionais e integrados para garantir um monitoramento abrangente de sua biodiversidade. Infelizmente, as ações do atual governo tem reduzido a capacidade científica e a extensão da proteção ambiental, ou seja, estamos no caminho oposto do ideal”.

Em última análise, a redução dos efeitos das mudanças climáticas exige a salvaguarda da biodiversidade. O professor Jos Barlow, da Universidade de Lancaster, explica: “A biodiversidade e as alterações climáticas estão intrinsecamente ligadas quando se fala em florestas tropicais. Um clima mais quente e mudanças nos padrões de chuvas levarão à extinção de muitas espécies tropicais e é importante lembrar que o carbono florestal reside na biodiversidade das florestas tropicais. A pobreza de espécies resultará inevitavelmente em pobreza de carbono. O enfrentamento da crise climática requer a proteção de ambos simultaneamente”.

LEIA O ARTIGO

Carbon-focused conservation may fail to protect the most biodiverse tropical forests

Joice Ferreira, Gareth D. Lennox, Toby A. Gardner, James R. Thomson, Erika Berenguer, Alexander C. Lees, Ralph Mac Nally, Luiz E. O. C. Aragão, Silvio F. B. Ferraz, Julio Louzada, Nárgila G. Moura, Victor H. F. Oliveira, Renata Pardini, Ricardo R. C. Solar, Ima C. G. Vieira & Jos Barlow

Nature Climate Change (2018)

(Texto: Ambiental Media)

INFORMAÇÃO PARA A IMPRENSA

Os autores estão disponíveis para entrevistas em inglês e em português. 

Prof. Ricardo Solar – co-autor
Departamento de Biologia Geral do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG. Belo Horizonte, Brasil.
Email:
Tel: +55 31 3409-2601

Dr. Joice Ferreira – autora co-líder do estudo
Embrapa Belém, Pará, Brasil
Email:

 

 

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